Zuenir Ventura, O Globo
Uma das diferenças entre Barack Obama e Bill Clinton, ou melhor, entre a época de um e a de outro, pode ser observada na última declaração do atual presidente sobre drogas. Em termos de costumes, a geração do marido de Hillary usava a meia verdade para confessar pecados do passado. Quando admitiu ter fumado maconha na juventude, fez logo a ressalva hipócrita: “Fumei, mas não traguei.” Ah, bom, então tudo bem. Já Obama revelou com todas as letras ter fumado, tragado a outrora chamada “erva maldita” e, pior, cheirado cocaína.
Fernando Henrique, que hoje encabeça uma corajosa campanha pela descriminalização do uso das drogas, teria dito o mesmo. Mas ele nega, até porque, garante, nunca usou nem cigarro comum (na campanha para a prefeitura de SP, em 1985, Jânio Quadros difundiu o boato devastador de que seu adversário, se eleito, o que não aconteceu, iria promover a distribuição de maconha nas escolas públicas).
Agora são tempos de abrir os armários. Veja outro tema tabu, a homossexualidade, cuja defesa não é mais apenas uma bandeira dos militantes. Depois que o STF reconheceu por unanimidade a união gay como legal (com direito a herança, pensão e adoção) e depois que o Papa Francisco recusou-se a estigmatizar os homossexuais (“Quem sou eu para julgá-los?”), a condição deixou de ser uma doença ou uma patologia social para ser o que é, uma opção sexual, com visibilidade cada vez maior em filmes, peças e novelas.
Apenas um exemplo. O personagem mais carismático de “Amor à vida” é uma bicha — e bicha má, como ele mesmo se classificava, de jogar criancinha em caçamba. O público já esqueceu essa e outras maldades de Félix, continua achando graça em seus trejeitos, está aceitando como natural sua redenção e torce para ele ficar com Nico, a bicha do bem. Se isso não acontecer, não será pela vontade popular, mas talvez porque, tecnicamente, a solução se mostraria impraticável. Segundo me ensinou um entendido, os dois só conjugam na voz passiva, o que tornaria a união homoafetiva inutilmente redundante. A conferir. Cartas para a coluna do Ancelmo.
Pode-se alegar que esse liberalismo só acontece na arte, já que na vida real, aqui e lá fora, continua havendo preconceito e violência homofóbica. Ou seja, mesmo num mundo ideal, sem intolerância, haverá sempre resíduos, como um Marco Feliciano e um Putin, para lembrar Shakespeare: “O mal que os homens praticam sobrevive a eles.”
Já tenho minhas divas do verão. São elas Soraya Ravenle, do musical sobre Chico Buarque; Laila Garin, de “Elis”; Dira Paes e Patrícia Pillar, de “Amores roubados"; Maya Gabeira, das ondas gigantes; e, mais formosa e irresistível do que todas, Alice, que dispensa justificativa.
Zuenir Ventura é jornalista.
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