terça-feira, 18 de setembro de 2012

Russomanno e a vulgaridade do desejo


O “patrulheiro do consumidor” lidera em São Paulo porque, se a política é de mercado, ele pode convencer como mercadoria

ELIANE BRUM
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Eliane Brum, jornalista, escritora e documentarista (Foto: ÉPOCA)
Como se define um povo? De várias maneiras. A principal, me parece, é pela qualidade do seu desejo. É por este viés que também podemos compreender o fenômeno Celso Russomanno (PRB). Como um homem que se tornou conhecido por bolinar mulheres na cobertura de bailes de carnaval e como “patrulheiro do consumidor” em programa da TV Record, apoiado pela Igreja Universal do Reino de Deus, torna-se líder de intenções de votos na maior cidade do Brasil?
Acredito que parte da resposta possa estar no desejo. Na vulgaridade do nosso desejo. No que consiste o desejo das diferentes camadas da população, seja o topo da pirâmide, a classe média tradicional, o que tem sido chamado de “nova classe média” ou classe C. Para além das diferenças, que são muitas, há algo que tem igualado a socialite que faz compras no Shopping Cidade Jardim, um dos mais luxuosos de São Paulo, ao jovem das periferias paulistanas carentes de serviços públicos de qualidade. E o que é? A identificação como consumidor, acima de todas as maneiras de olhar para si mesmo – e para o outro. É para consumir que boa parte da população não só de São Paulo quanto do Brasil urbano tem conduzido o movimento da vida – e se consumido neste movimento.
Dois textos recentes são especialmente reveladores para nos ajudar a compreender o Brasil atual.
Em sua coluna de 4/9, na Folha de S. Paulo, o filósofo Vladimir Safatle faz uma análise interessantíssima do caso Russomanno. Ele parte do fato de que a ascensão econômica de larga parcela da população no lulismo se dá principalmente pela ampliação das possibilidades de consumo – e não pela ampliação do acesso a serviços sociais de qualidade. Logo, para essa camada da população, os direitos da cidadania são decodificados como direitos do consumidor. Nada mais lógico para representá-la e defender seus interesses do que um prefeito que seja um pretenso “patrulheiro do consumidor”, bancado por uma das igrejas líderes da “teologia da prosperidade”. Russomanno seria, na definição de Safatle, “o filho bastardo do lulismo com o populismo conservador”.
Na ótima reportagem intitulada “O Funk da Ostentação em São Paulo”, o repórter de Época Rafael de Pino conta como se dá a apropriação do funk carioca nas periferias de São Paulo. Preste atenção na abertura da matéria, que reproduzo aqui: 
‘Vida é ter um Hyundai e uma Hornet/10 mil pra gastar, Rolex e Juliet’, canta o paulista MC Danado no funk ‘Top do momento’. Para quem não entendeu, ele fala, na ordem, de um carro, uma moto, dinheiro, um relógio e um par de óculos – um refrão avaliado em R$ 400 mil. Na plateia do show na Zona Leste, região que concentra bairros populares de São Paulo, os versos são repetidos aos berros pelas quase 1.000 pessoas presentes, que pagaram ingressos a R$ 30. O público da sexta-feira é jovem, etnicamente diverso e poderia ser descrito em três palavras: ‘classe C emergente’.”
MC Danado, como nos conta Rafael de Pino, antes de se tornar um astro, trabalhou como office-boy e auxiliar de escritório. Ele diz o seguinte: “Gosto da ostentação, gosto de ostentar. Parte do que canto, eu tenho. Outra parte, desejo e vou conquistar com meu trabalho”. Vale a pena conferir os refrões de outros funkeiros da ostentação, como MC Guimê: “Ta-pa-ta-pa tá patrão, ta-pa-ta-pa tá patrão/Tênis Nike Shox, Bermuda da Oakley, Olha a situação”. Ou MCs BackDi e Bio-G3: “É classe A, é classe A/quando o bonde passa nas pistas geral, tá ligado que é ruim de aturar/É classe A, é classe A/Nós tem carro, tem moto e dinheiro”.
MC Menor, outra estrela ascendente, explica: “Enxergo o mundo como meu público enxerga. Nasci na comunidade, sei que lá ninguém quer cantar pobreza e miséria”. Não por acaso, é em São Paulo que o funk se torna uma expressão do desejo de consumo da juventude emergente das periferias. 
Ao ascender economicamente, a “nova classe média” parece se apropriar da visão de mundo da classe média tradicional – talvez com mais pragmatismo e certamente com muito mais pressa. Em vez de lutar coletivamente por escola pública de qualidade, saúde pública de qualidade, transporte público de qualidade, o caminho é individual, via consumo: escola privada e plano de saúde privado, mesmo que sem qualidade, e carro para se livrar do ônibus, mesmo que fique parado no trânsito. O núcleo a partir do qual são eleitas as prioridades não é a comunidade, mas a família. 
  
Se no passado recente o rap arrastou multidões nas periferias de São Paulo com um discurso fortemente ideológico contra o mercado, hoje o espaço é parcialmente ocupado pelo “funk da ostentação” e seu discurso de que uma vida só ganha sentido no consumo. As marcas de uma vida não se dão pela experiência, mas se adquirem pela compra: as marcas da vida são grifes de luxo, segundo nos informam as letras do funk paulista. Alguns dos grandes nomes do rap engajado do passado também podem ser vistos hoje anunciando produtos na TV com desembaraço – o que também quer dizer alguma coisa.
É importante observar, porém, que aquilo que eu tenho chamado aqui de vulgaridade do desejo não é uma novidade trazida pela “nova classe média”. Ao contrário, a influência tem sinal trocado. O que os emergentes da classe C tem feito é se apropriar da vulgaridade do desejo das elites. O funk da ostentação de MC Danado, ao recitar grifes e fazer uma ode ao consumo, pode estar na boca de qualquer socialite que possamos entrevistar agora no corredor de um dos shoppings de luxo.

Neste contexto, a vulgaridade do desejo tem em Russomanno sua expressão mais bem acabada na política. Assim como na religião encontra expressão em parte das igrejas evangélicas neopentecostais e sua teologia do compre agora para ganhar agora. Nesta eleição de São Paulo, testemunhamos uma aliança e uma síntese da nova configuração do Brasil – possivelmente menos transitória do que alguns acreditam ser.
Russomanno não inventou a vulgaridade do desejo – apenas a explicitou e tratou de encarná-la. Seus oponentes têm uma biografia muito mais relevante, assim como partidos mais sólidos. Mas parecem ter perdido essa vantagem junto a setores da população no momento em que se renderem à lógica do consumo e viraram também eles um produto eleitoral. Pela adesão à política de mercado, perderam a chance de representar uma alternativa, inclusive moral.

José Serra (PSDB) tem feito quase qualquer coisa para conquistar o apoio das igrejas na tentativa de vencer as disputas eleitorais. Basta lembrar como um dos exemplos mais contundentes o falso debate do aborto estimulado por ele na última eleição presidencial, na ânsia de ganhar o voto religioso. E Fernando Haddad (PT), que se pretende “novo”, antes do início oficial da campanha já tinha abraçado o velho Maluf. Para quê? Para ter mais tempo de TV – o lugar por excelência no qual os produtos são “vendidos” aos consumidores.
Quem transformou eleitores em consumidores de produtos eleitorais não foi Celso Russomanno. Ele apenas aproveitou-se da conjuntura propícia – e não perdeu a oportunidade ao perceber que os outros reduziram-se a ponto de jogar no seu campo. Afinal, de mercadoria Russomanno entende.
É bastante interessante que entre os mais perplexos diante deste novo Brasil, representado pelo fenômeno Russomanno, estejam o PT e a Igreja Católica. Ambos, porém, estão no cerne da mudança que agora se desenha com maior clareza. 
A “era” Lula marcou e segue marcando sua atuação também pelo esvaziamento dos movimentos sociais – e da saída coletiva, construída e conquistada que foi decisiva para a formação do PT. Também estimulou sem qualquer prurido o personalismo populista na figura do líder/pai. Assim como na campanha que elegeu Dilma Rousseff, a sucessora de Lula no governo foi apresentada como filha do pai/mãe do povo. Em nenhum momento, nem o PT nem Lula pareceram se importar de verdade com o fato de que os numerosos militantes que no passado ocupavam os espaços públicos com suas bandeiras e seu idealismo foram gradualmente sendo substituídos por cabos eleitorais pagos, em mais uma adesão à lógica de mercado.
 A cúpula da Igreja Católica no Brasil, por sua vez, atendendo às diretrizes do Vaticano, esforçou-se nas últimas décadas para esvaziar movimentos como a Teologia da Libertação, que representavam uma inserção do evangelho na política pelo caminho coletivo e pela formação de base. Esforçou-se com tanto afinco que perseguiu alguns de seus representantes mais importantes – e marginalizou outros. Mas parece que nem o PT de Lula nem a CNBB têm compreendido que o fenômeno Russomanno também foi gerado no ventre de suas guinadas conservadoras – e, no caso do PT, de suas alianças pragmáticas e da sua atuação para transformar a política num balcão de negócios. Sem esquecer, claro, que o PRB de Russomanno é da base de apoio do governo Dilma.
Quando a presidente do país dá o Ministério da Cultura para Marta Suplicy, para que ela suba no palanque do candidato do PT à prefeitura de São Paulo, por mais que os protagonistas aleguem apenas coincidência, é só política de mercado que enxergamos. E tudo piora quando Marta invoca uma trindade político-religiosa no palanque de Haddad: “O trio é capaz de alavancar (a candidatura de Haddad): a presidente Dilma, o Lula e eu. Eu, porque tenho o apelo de quem fez; eu sou a pessoa que faz. O Lula porque é um ‘deus’ e a presidente Dilma porque é bem avaliada. Então, com a entrada desse trio, vai dar certo”.
Diante do que está aí, feito e dito, por que o eleitor vai achar que Russomanno é pior? Ou que as alternativas a ele são de fato diferentes?
O mais importante não é atacar Celso Russomanno, mas compreender o que ele revela do Brasil atual. O fenômeno Russomanno pode ter algo a nos ensinar. Quem sabe sua liderança nas pesquisas eleitorais possa mostrar aos futuros candidatos que ética e coerência na política valem a pena se quiserem se tornar alternativas reais para uma parcela do eleitorado. Ou que se nivelar por baixo em nome dos fins pode ser um tiro no pé – tanto quanto se aliar com qualquer um. E talvez o fenômeno Russomanno possa ensinar aos futuros governantes que um povo se define pela qualidade do seu desejo. E desejo só se qualifica com educação.
Sempre se pode lamentar que o eleitor deseje o que deseja, mas o eleitor – em geral subestimado – sabe o que quer. Se a maioria acredita que tudo o que dá sentido a uma vida humana pode ser comprado num shopping, então São Paulo – e o Brasil – merecem Celso Russomanno. 
Eliane Brum escreve às segundas-feiras.

quarta-feira, 5 de setembro de 2012

Brazil Enacts Affirmative Action Law for Universities


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RIO DE JANEIRO — Brazil’s government has enacted one of the Western Hemisphere’s most sweeping affirmative action laws, requiring public universities to reserve half of their admission spots for the largely poor students in the nation’s public schools and vastly increase the number of university students of African descent across the country.
Ueslei Marcelino/Reuters
The legislation was signed into law on Wednesday by President Dilma Rousseff of Brazil.
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The law, signed Wednesday by President Dilma Rousseff, seeks to reverse the racial and income inequality that has long characterized Brazil, a country with more people of African heritage than any nation outside of Africa. Despite strides over the last decade in lifting millions out of poverty, Brazil remains one of the world’s most unequal societies.
“Brazil owes a historical debt to a huge part of its own population,” said Jorge Werthein, who directs the Brazilian Center for Latin American Studies. “The democratization of higher education, which has always been a dream for the most neglected students in public schools, is one way of paying this debt.”
As in the United States, affirmative action has stirred controversy and opposition here, even at some of the state universities that are exempt from the new law and have their own programs to admit underprivileged students. Critics contend that enforcing expansive quotas will undercut the quality of Brazil’s public university system, given the nation’s relatively weak public elementary and secondary schools. “You don’t create capable and creative people by decree,” said Leandro Tessler, institutional relations coordinator at the University of Campinas.
But while affirmative action has come under threat in the United States, it is taking deeper root in Brazil, Latin America’s largest country. Though the new legislation, called the Law of Social Quotas, is expected to face legal challenges, it drew broad support among lawmakers.
Of Brazil’s 81 senators, only one voted against the law this month. Other spheres of government here have also supported affirmative action measures. In a closely watched decision in April, the Supreme Court unanimously upheld the racial quotas enacted in 2004 by the University of Brasília, which reserved 20 percent of its spots for black and mixed-race students.
Dozens of other Brazilian universities, both public and private, have also adopted their own affirmative action policies in recent years, trying to curb the dominance of such institutions by middle- and upper-middle-class students who were educated at private elementary and secondary schools. Public universities in Brazil are largely free of charge and generally of better quality, with some exceptions, than private universities.
Still, some education experts are already predicting a shift to the better private universities among some students. “With these quotas, these rich Brazilians who took up their spots will not be abandoned,” argued Frei David Santos, 60, a Franciscan friar in São Paulo who directs Educafro, an organization preparing black and low-income students for university entrance exams. “Their parents who had money saved will spend it” on elite private universities.
The Law of Social Quotas takes the previous affirmative action policies to another level, giving Brazil’s 59 federal universities just four years to ensure that half of the entering class comes from public schools. Luiza Bairros, the minister in charge of Brazil’s Secretariat for Policies to Promote Racial Equality, said officials expected the number of black students admitted to these universities to climb to 56,000 from 8,700.
The law obligates public universities to assign their spots in accordance with the racial makeup of each of Brazil’s 26 states and the capital, Brasília. In states with large black or mixed-race populations, like Bahia in the northeast, that could lead to a surge in black university students, while states in southern Brazil, which are largely white, could still have relatively few black students in public universities.
The new law recognizes that Brazil has remained far from the ideal of “racial democracy” espoused by the influential sociologist Gilberto Freyre, who argued that Brazil escaped much of the prejudice and discrimination he witnessed while studying in the segregation-era United States.
Brazil’s former president, Luiz Inácio Lula da Silva, said in an interview that he was “completely in favor” of the quotas. “Try finding a black doctor, a black dentist, a black bank manager, and you will encounter great difficulty,” Mr. da Silva said. “It’s important, at least for a span of time, to guarantee that the blacks in Brazilian society can make up for lost time.”
Brazil’s 2010 census showed that a slight majority of this nation’s 196 million people defined themselves as black or mixed-race, a shift from previous decades during which most Brazilians called themselves white.
Still, some prominent Brazilians have expressed concern about the scope of the quotas. “It’s important to compensate people, but the way to do that cannot be a copy of what has been done in one moment in the U.S.,” Fernando Henrique Cardoso, Mr. da Silva’s predecessor as president, said in an interview. “I think it’s better to leave more freedom for universities to show how to adjust.”
Despite such reservations, Brazilian officials say the law signifies an important shift in Brazil’s view on offering opportunities to big swaths of the population.
“Brazil is experiencing an extremely positive moment,” said Ms. Bairros, the minister promoting racial equality. “Next, we will seek to extend this concept to other areas, like culture and jobs.”
Taylor Barnes and Lis Horta Moriconi contributed reporting.

terça-feira, 4 de setembro de 2012

Testes de RH

Eu sempre fui muito cético com testes de RH. Na verdade, RH sempre foi uma área que me deu bode...

Mas num é que os resultados do teste que eu fiz aqui na Monsanto não são SUPER verdadeiros? Sobre o perfil profissional e pessoal: Facet5.

Bem por alto, o teste analisa os seguintes fatores para traçar o perfil:

- Determinação (Convicçào, confronto e independência)
- Energia (Entusiasmo, Sociabilidade e adaptabilidade)
- Afetividade (Altruísmo, suporte e confiança)
- Controle (Disciplina e senso de dever)
- Emocionalidade (Ansiedade e apreensào)

O meu perfil é o Facilitador

"Bruno é sociável com um interesse genuíno e afeição por pessoas. Tolerante e compreensivo, muitas vezes coloca a necessidade do outro em primeiro lugar. Bruno é criativo, possui a mente aberta e sempre tenta trabalhar em conjunto com as pessoas para atingir um verdadeiro consenso"

Daí o teste abre pontos de desenvolvimento, liderança, motivadores e desmotivadores.. Mas fiquei de bode de copiar e escrever aqui ;)

O noivo da minha melhor amiga

Keskonfusao, ne

Kesfilmefraco mas legal

Kesfinal obvio que eu nao gosto


Os homens que não amavam as mulheres

Mais um livro pra "Meta 2012"!

O livro é muito bom, detalhista, meticuloso (adoro essa palavra). Ainda bem que é uma trilogia e esse foi só o primeiro!


Procura-se um amigo para o fim do mundo

Bem bonitinho o filme. Bem para ver com a namorada num sabado a tarde mesmo :)


FHC, ex-presidente muito mimado



Eu acho que os amigos e admiradores de Fernando Henrique Cardoso, situados no topo de nossa pirâmide social,  deveriam evitar mimos exagerados.
Vão acabar estragando este político e intelectual culto e simpático, que já passou dos 80. FHC participou da luta pela democratização, fez um governo com realizações discutíveis, algumas trágicas e  outras muitos importantes. Também   deixou muitas recordações junto a tantos brasileiros.

Poucos  tiveram a honra de sentar-se à mesa para debater política com Fernando Henrique Cardoso. Eu já.
Em 1975, em plena ditadura militar, FHC compareceu a um debate na USP para discutir a luta pela democratização do país.
Foi um encontro de horas, animado, divertido e inesquecível. Quando me encontra, mais de 30 anos  depois, FHC não deixa de fazer brincadeiras a respeito.

No Brasil de 2012, FHC é um ex-presidente mimado. Você entende a situação. A oposição não ganha uma eleição há três campanhas presidenciais.  Colocou seu principal herdeiro para disputar o pleito em São Paulo como se fosse a mãe de todas as batalhas e agora enfrenta a possibilidade de  encarar a mais dolorosa de todas as derrotas. Aquele que seria o favorito para concorrer em 2014 anda cada vez mais discreto…
Sobrou FHC e ninguém para de falar bem dele. Repare: parece que Fernando Henrique tem razão antes de começar a falar.

Você conhece a situação do garoto mimado. É aquele que é dono da bola e das camisas – e sempre tem lugar garantido no time titular. A mãe nunca dá bronca e o pai sempre arruma um jeito de melhorar a mesada.
As professoras o protegem na sala de aula. Melhoram as notas até quando não merece. Tem aluno que faz muito mais força e nunca recebe o mesmo elogio. Todos nós já vimos isso.
Mas os pedagogos de bairro advertem: graças a esse ambiente de tolerância excessiva, o garoto mimado abusa – e todo mundo acha graça. Não precisa assumir responsabilidades pelo que faz.
Sempre aponta defeitos nos outros.

Qualquer sociólogo B – como filmes B – entende o que ocorre. Os mimos vem de longe mas se acentuaram de uns tempos para cá.
Há  um sentimento de culpa em relação a FHC. Abandonado na hora em que teria sido ético fazer sua defesa,  agora lhe permitem falar o que quer. Pagam a dívida em dobro, com juros  de Pedro Malan.  É  sempre elogiado, lhe passam a mão na cabeça e jamais se ouve uma critica. Faça um teste, você mesmo.

Dê uma gugada e procure um adjetivo negativo, uma observação crítica ou mesmo uma ironia.  Daqui a pouco, vão dizer que a Dilma só faz um bom governo porque vez por outra trocou umas palavrinhas gentis com ele e parou de levar em conta dseu padrinho Luiz Inácio Lula da Silva.
Já perdi a conta de quantos livros saíram sobre ele, quantos balanços, quantas interpretações. Gostam tanto de FHC que o formato preferido é de livros-entrevista, onde o próprio protagonista tem a palavra final.

FHC ganhou até uma antologia de fotos. Ficou bem até quando falou que era preciso legalizar a maconha, cocaína, heroína… Em teatro isso se chama fazer o coro. O personagem principal diz o que pensa e os coadjuvantes dão sustentação:  repetem, perguntam se não foi mesmo bacana, e assim por diante. Isso é o mais importante. Os universitários, como dizia Silvio Santos, precisam dar razão.
Mas: e a política? A economia? O texto? O debate? O contraponto? Sem substância, os mimos parecem hipocrisia,  não é mesmo?

Os carinhos desmedidos são tantos, e tão intensos, que muitas pessoas acreditam, como se fosse um fato demonstrado cientificamente, que tudo o que aconteceu de bom no Brasil depois de 2003 é fruto da herança do governo FHC.
Tudo: do Bolsa Família ao crescimento duas vezes maior do que na década anterior, a redistribuição de renda,  a valorização do salario mínimo, o reforço nas garantias dos assalariados, a reação imediata ao colapso dos mercados.

Alfredo Bosi, que dedica vários parágrafos de Dialética da Colonização a criticar FHC, admite que se trata de uma águia intelectual – consegue enxergar, muito longe, mudanças e evoluções que escapam aos observadores pedestres.
Os mimos ajudam a explicar   o último artigo de FHC,  publicado no Globo e no Estado. O texto tem o título de “Herança Pesada” e se dedica avaliar o governo Lula. Pode ser resumido nestas 21 palavras:
“É pesada como chumbo a herança desse estilo bombástico de governar que esconde males morais e prejuízos materiais sensíveis para o futuro da Nação.”

Vamos combinar. Fernando Henrique entregou um país com a inflação em dois dígitos. Os impostos foram às alturas e só os bobos e acham que a carga tributária é obra de seu sucessor.  O desemprego subiu. Sua popularidade era negativa em 13 pontos. Quando foi positiva era menor que a de José Sarney do Plano Cruzado. E antes que você diga que isso é populismo, não custa lembrar que, numa democracia, a opinião popular é (ou deveria ser) muito importante. Essencial, na verdade. Todos os políticos deveriam saber disso.
E a herança de Lula é que é “pesada como chumbo?” Gerou “males morais e prejuízos materiais”?

É mimo demais.