terça-feira, 20 de setembro de 2011

O mercado tem razão


Vencimento de dívidas

O quadro ao lado mostra a razão de os mercados financeiros estarem como estão.
São os vencimentos de dívidas do setor público de alguns dos países europeus mais afetados pelo pessimismo de investidores, empresários e consumidores.
A conta de dívidas neste ano é até pequena quando colocada na perspectiva dos quatro anos à frente.
O problema central é que os países envolvidos parecem condenados a vários anos de baixo crescimento e arrecadação de impostos (para pagar dívidas) também pequena. O mercado vislumbra um calote.
Por isso cobra juros cada vez maiores para emprestar a esses governos, agravando o quadro geral.
Nessa montanha de dívidas e vencimentos estão pendurados os bancos. Eles são os principais credores dos volumes que o quadro mostra. Por trás dos bancos, empresas e consumidores também endividados.
É natural o pessimismo. O problema é que ele só agrava o cenário.
Investidores fogem de ações e querem se desfazer de ativos, como imóveis. Já quem não tem nada, apenas dívidas, procura poupar ao máximo, esfriando o consumo.
Há uma desvalorização geral de tudo. Para os governos endividados, fica cada vez mais difícil pagar dívidas, pois a arrecadação de impostos para isso depende do crescimento da economia.
"Reestruturação" de dívidas, com aumento dos prazos para pagamento e redução de juros deve ser a saída desse nó. Isso se torna cada vez mais inevitável.
Não é o fim do mundo. Mas haverá uma modificação nele.
No final dos anos 1980, alguns países em desenvolvimento (Brasil incluso) deram um calote organizado em suas dívidas. O Plano Brady (Nicholas Brady era secretário do Tesouro dos EUA) alongou prazos e reduziu juros dos débitos.
Coisa que EUA e Europa precisam agora. É o que se tenta fazer com a Grécia, a ponta do iceberg de dívidas europeu.
Pelo visto, a saída é por aí: reconhecer que as dívidas são impagáveis, que afetam o crescimento (tonando-as mais impagáveis ainda) e reestruturá-las. Foi isso o que ocorreu há 20 anos com os Brady, os bônus que substituíram as dívidas dos endividados.
O problema é que na época os países envolvidos eram insignificantes no quadro global: Brasil, México, Equador, Uruguai, entre outros exportadores de produtos básicos.
E eles tiveram na sequência do plano algo que os países ricos jamais terão: a China emergente e voraz por commodities que os ajudou a reequilibrar as contas.
É esse horizonte (ou a falta dele) que o mundo financeiro hoje vislumbra.
Fernando Canzian
Fernando Canzian é repórter especial da Folha. Foi secretário de Redação, editor de Brasil e do Painel e correspondente em Washington e Nova York. Ganhou um Prêmio Esso em 2006 e é autor do livro "Desastre Global - Um ano na pior crise desde 1929". Escreve às segundas-feiras na Folha.com.

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