sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

A gente é tenso!

Até no casamento de Renatao!!!

quinta-feira, 27 de fevereiro de 2014

Tirei de Letra

Meu sonho é chegar em casa pra baixar essa música!!!! Os caras que escreveram Maus Bocados (!!!) cantando com Cris (!!!). Já me vejo bebado no show de CA cantando essa música



quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

Nós, os mesquinhos

IVAN MARTINS
26/02/2014 09h37

Cultura não é só música, literatura e ideias complicadas. Cultura é aquilo que a gente faz diariamente. Ela se manifesta na forma como pensamos, falamos e agimos. Ela se revela na forma como lidamos com o mundo. Existe uma cultura que é pessoal e exclusiva, mas boa parte daquilo que a gente chama de cultura é coletiva. É a cultura de um grupo de pessoas numa determinada época e lugar. Nossa cultura.
As regras do relacionamento se incluem nesse pacote. Aquilo que você e eu achamos intolerável ou bonito na vida de um casal é ditado pela visão do nosso grupo sobre como deve ser um relacionamento. Ela pode variar um pouco de homens para mulheres, de pobres para ricos e de cultos para incultos, mas existe, acima das diferenças de gênero e de classe social, uma espessa camada de concordância em torno do assunto. Há no Brasil uma cultura de relacionamentos com a qual nós todos nos identificamos, em alguma medida.
Outro dia, numa festa de aniversário repleta de amigos, a evidência desse fato me saltou aos olhos, da forma mais absurda.
Um rapaz que estava sozinho convidou uma moça que passava ao lado dele para dançar. Ela topou sem hesitar, mas o namorado dela, que esperava num canto, não gostou daquilo. Enquanto o estranho e a moça giravam e conversavam na pista, o namorado dava sinais de que iria explodir. O aniversariante, sentindo o clima tenso, achou necessário conversar com o namorado antes que a música acabasse. Explicou – vejam só – que o rapaz com quem a moça estava dançando era, além de um amigo querido, gay. O cara se acalmou, mas, uma hora depois, ainda podia ser visto no mesmo canto da festa, numa conversa tensa e interminável com a namorada pé de valsa. Uma DR daquelas.
Duas perguntas inevitáveis: se o dono da festa não tivesse percebido o drama em curso e não tivesse agido para desarmar a bomba, o que aconteceria? Segunda e mais grave pergunta: o que aconteceria se o rapaz que tirou a moça para dançar não fosse gay?
No finalzinho da festa, quando o casal em crise já tinha partido, sentamos, eu e os mais próximos, para tomar a saideira. Quando comentei o quase barraco que se armara na pista, criaram-se dois movimentos de opinião convergentes. O primeiro dizia que o namorado dera sinais de ser ciumento demais. Aquilo fora um exagero condenável. O segundo movimento, mais sutil, começava com a frase “mas também, né?”, e terminava expressando alguma simpatia pelo comportamento dele. Alguém disse textualmente o que todos pareciam estar pensando: “Eu também ficaria incomodada”.
Por isso eu comecei esta coluna falando sobre cultura. Embora todos tenham sentido que o namorado ciumento pisara na bola, ao mesmo tempo todos achavam compreensível a reação dele. No contexto da nossa cultura, alguém que tira para dançar uma pessoa acompanhada, mesmo numa festa de amigos, viola uma regra de propriedade. E quem aceita dançar com um estranho em frente ao parceiro ou à parceira se arrisca a provocar confusão. Descontados os excessos, nos parece natural que seja assim. A posse e o controle de um parceiro sobre o outro fazem parte da nossa cultura afetiva.
Sem me colocar distante disso tudo – é capaz que eu também ficasse incomodado – convido vocês a contemplarem comigo o absurdo da situação.
É terrível que uma mulher casada ou que tenha namorado não possa nem dançar com outro homem durante uma festa. É grave que um homem comprometido não possa nem olhar para uma mulher bonita sem despertar a raiva ou as ironias da parceira dele. Se prestarmos atenção a isso, veremos que as proibições mútuas incluem uma infinidade de outros verbos. Não podemos conversar, olhar, rir, jantar, encontrar, caminhar, viajar, telefonar, trocar emails... Faça a sua lista.
Cabe perguntar, na verdade, que parte da nossa vida ainda nos pertence depois que nos associamos a alguém. Ou, posto de outra forma: o que podemos fazer em companhia de outras pessoas sem a sensação de estar fazendo coisa errada – e sem o risco de provocar uma crise em nosso relacionamento? Pouco, ou quase nada.
Eu não tenho dúvida de que os controles mesquinhos empobrecem a nossa vida e os nossos sentimentos.
Tal como eu vejo, a nossa jornada através da existência deveria ser marcada por uma conquista cada vez maior de paz e liberdade. A gente começa um bebê cheio de medos e os vai deixando para trás, à medida que cresce. As relações controladoras representam o oposto desse crescimento. Elas reafirmam os medos infantis, as inseguranças primitivas. Eu preciso controlar o outro porque o que eu sinto por ele é tão forte que me deixa inseguro. Eu preciso controlar também porque tenho de medo de ele ou ela me exponha ao ridículo diante do grupo. Além de ser tremendamente inquietante, além de ser o contrário da paz, isso é o oposto dos sentimentos adultos. Em vez de independência, cultivo o controle e a dependência do outro por mim, que é uma forma de prisão para nós dois. Em vez de procurar a autonomia, passo a vida intimidado pelas opiniões do grupo, cortejando a aprovação do bando como se fosse um eterno adolescente.
Esse comportamento, embora aprovado pela cultura dominante, faz mal ao nosso convívio e à nossa personalidade. A posse e o controle do outro nos transforma em pessoas muito piores do que poderíamos ser – e, lá no fundo, nós percebemos isso, na forma de um mal estar inexplicável. Só imbecis e psicopatas se orgulham de manter alguém preso a uma corrente. Só doentes rejubilam em exercer controle sobre outro ser humano. A maioria de nós convive dolorosamente com a contradição entre nosso potencial para a liberdade e as regras de uma cultura que nos transforma em vítimas e algozes das pessoas que amamos.
Os limites que a gente impõe à vida do parceiro são uma espécie de cerca que impede a nossa própria liberdade – e causa tremenda dor. Por isso é importante questionar a cultura a nossa volta. Por isso é essencial olhar criticamente para o comportamento dos outros e para o nosso. Não se pode permitir que coisas erradas se perpetuem, por serem corriqueiras e banais. Ao contrário dos bichos, cujo comportamento é todo codificado pelos genes, nós vivemos num mundo regido pela cultura, infinitamente mais flexível. Ela pode mudar em uma geração. Ela pode mudar depois de amanhã, se houver uma revolução súbita nos costumes. Ela pode começar a mudar agora, na nossa cabeça, no exato instante em que percebemos que a vida pode ser melhor se desistirmos de controlar e vigiar como crianças assustadas.

Ivan Martins escreve às quartas-feiras.

A Paixão Segundo G.H

De Clarisse Lispector

estou procurando, estou procurando. Estou tentando 
entender. Tentando dar a alguém o que vivi e não sei a quem, mas 
não quero ficar com o que vivi. Não sei o que fazer do que vivi, 
tenho medo dessa desorganização profunda. Não confio no que me 
aconteceu. Aconteceu-me alguma coisa que eu, pelo fato de não a 
saber como viver, vivi uma outra? A isso quereria chamar 
desorganização, e teria a segurança de me aventurar, porque 
saberia depois para onde voltar: para a organização anterior. A isso 
prefiro chamar desorganização pois não quero me confirmar no 
que vivi - na confirmação de mim eu perderia o mundo como eu o  
tinha, e sei que não tenho capacidade para outro. 
Se eu me confirmar e me considerar verdadeira, estarei 
perdida porque não saberei onde engastar meu novo modo de ser - 
se eu for adiante nas minhas visões fragmentárias, o mundo 
inteiro terá que se transformar para eu caber nele. 
Perdi alguma coisa que me era essencial, e que já não me é 
mais. Não me é necessária, assim como se eu tivesse perdido uma 
terceira perna que até então me impossibilitava de andar mas que 
fazia de mim um tripé estável. Essa terceira perna eu perdi. E 
voltei a ser uma pessoa que nunca fui. Voltei a ter o que nunca 
tive: apenas as duas pernas. Sei que somente com duas pernas é 
que posso caminhar. Mas a ausência inútil da terceira me faz falta 
e me assusta, era ela que fazia de mim uma coisa encontrável por 
mim mesma, e sem sequer precisar me procurar. 
Estou desorganizada porque perdi o que não precisava? Nesta 
minha nova covardia - a covardia é o que de mais novo já me 
aconteceu, é a minha maior aventura, essa minha covardia é um 
campo tão amplo que só a grande coragem me leva a aceitá-la -, na 
minha nova covardia, que é como acordar de manhã na casa de 
um estrangeiro, não sei se terei coragem de simplesmente ir. É 
difícil perder-se. É tão difícil que provavelmente arrumarei 
depressa um modo de me achar, mesmo que achar-me seja de 
novo a mentira de que vivo. Até agora achar-me era já ter uma 
idéia de pessoa e nela me engastar: nessa pessoa organizada eu 
me encarnava, e nem mesmo sentia o grande esforço de 
construção que era viver. A idéia que eu fazia de pessoa vinha de 
minha terceira perna, daquela que me plantava no chão. Mas e 
agora? estarei mais livre? 
Não. Sei que ainda não estou sentindo livremente, que de 
novo penso porque tenho por objetivo achar - e que por segurança 
chamarei de achar o momento em que encontrar um meio de 
saída. Por que não tenho coragem de apenas achar um meio de 
entrada? Oh, sei que entrei, sim. Mas assustei-me porque não sei 
para onde dá essa entrada. E nunca antes eu me havia deixado 
levar, a menos que soubesse para o quê. 
Ontem, no entanto, perdi durante horas e horas a minha 
montagem humana. Se tiver coragem, eu me deixarei continuar  
perdida. Mas tenho medo do que é novo e tenho medo de viver o 
que não entendo quero sempre ter a garantia de pelo menos estar 
pensando que entendo, não sei me entregar à desorientação. Como 
é que se explica que o meu maior medo seja exatamente em 
relação: a ser? e no entanto não há outro caminho. Como se 
explica que o meu maior medo seja exatamente o de ir vivendo o 
que for sendo? como é que se explica que eu não tolere ver, só 
porque a vida não é o que eu pensava e sim outra como se antes 
eu tivesse sabido o que era! Por que é que ver é uma tal 
desorganização? 
E uma desilusão. Mas desilusão de quê? se, sem ao menos 
sentir, eu mal devia estar tolerando minha organização apenas 
construída? Talvez desilusão seja o medo de não pertencer mais a 
um sistema. No entanto se deveria dizer assim: ele está muito feliz 
porque finalmente foi desiludido. O que eu era antes não me era 
bom. Mas era desse não-bom que eu havia organizado o melhor: a 
esperança. De meu próprio mal eu havia criado um bem futuro. O 
medo agora é que meu novo modo não faça sentido? Mas por que 
não me deixo guiar pelo que for acontecendo? Terei que correr o 
sagrado risco do acaso. E substituirei o destino pela probabilidade. 
No entanto na infância as descobertas terão sido como num 
laboratório onde se acha o que se achar? Foi como adulto então 
que eu tive medo e criei a terceira perna? Mas como adulto terei a 
coragem infantil de me perder? Perder- se significa ir achando e 
nem saber o que fazer do que se for achando. As duas pernas que 
andam, sem mais a terceira que prende. E eu quero ser presa. Não 
sei o que fazer da aterradora liberdade que pode me destruir. Mas 
enquanto eu estava presa, estava contente? Ou havia, e havia, 
aquela coisa sonsa e inquieta em minha feliz rotina de prisioneira? 
Ou havia, e havia, aquela coisa latejando, a que eu estava tão 
habituada que pensava que latejar era ser uma pessoa. É? 
Também , também. 
Fico tão assustada quando percebo que durante horas perdi 
minha formação humana. Não sei se terei uma outra para 
substituir a perdida. Sei que precisarei tomar cuidado para não 
usar superficialmente uma nova terceira perna que em mim 
renasce fácil como capim, e a essa perna protetora chamar de uma 
verdade Mas é que também não sei que forma dar ao que me 
aconteceu. E sem dar uma forma, nada me existe. E - e se a 
realidade é mesmo que nada existiu?! Quem sabe nada me 
aconteceu? Só posso compreender o que me acontece mas só 
acontece o que eu compreendo - que sei do resto? O resto não 
existiu. Quem sabe nada existiu! Quem sabe me aconteceu apenas 
uma lenta e grande dissolução? E que minha luta contra essa 
desintegração está sendo esta: a de tentar agora dar-lhe uma 
forma? Uma forma contorna o caos, uma forma dá construção à 
substância amorfa - a visão de uma carne infinita é a visão dos 
loucos, mas se eu cortar a carne em pedaços e distribuí-los pelos 
dias e pelas fomes - então ela não será mais a perdição e a 

loucura: será de novo a vida humanizada. 

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

Amor armado

IVAN MARTINS
19/02/2014 08h56 - Atualizado em 19/02/2014 09h22

Aconteceu na manhã do domingo. Viviane batizava seu filho em companhia do namorado e da família. Ao final da cerimônia, o ex-marido dela levantou-se do fundo da igreja, caminhou até o casal e disparou contra eles. Viviane morreu na hora. Seu namorado morreu a caminho do hospital. O assassino fugiu, abrindo caminho à bala, e ainda está escondido por aí.

Essa história macabra aconteceu no domingo passado em Guarulhos, na Grande São Paulo, mas poderia ter sido em qualquer parte do país, a qualquer tempo.

Todos os anos, são mortas no Brasil quase 5700 mulheres. A média é de 472 assassinatos por mês. Os números são medonhos, mas não contam metade do drama. A vida de Viviane, que tinha 34 anos, simplesmente não cabe nessa estatística. Sua personalidade, seus sonhos, o futuro de seus dois filhos. Suas lembranças, seus medos, o momento em que as promessas de amor se transformaram em ameaças. Nada disso é mensurável e tudo foi destruído – como é destruído 5700 vezes ao ano, toda vez que um homem mata sua companheira no Brasil do século XXI.
Se você pedir a um sociólogo que explique esse massacre, ele talvez diga que os homens brasileiros estão perdendo poder. As mulheres se tornaram independentes e a violência masculina seria uma resposta a essa mudança indesejada. Colocados diante de parceiras que estudam mais do que eles, que ganham tanto quanto eles e que sentem-se donas do seu corpo e do seu destino (capazes de trocar de namorado ou de marido), os homens respondem com brutalidade. Xingam, agridem, matam.

Há um contexto cultural para a barbárie, claro. O Brasil é profundamente machista. Não é um psicopata com antecedentes clínicos que esgana a ex-namorada e vira manchete. Aqui, são centenas de mortes todos os meses, perpetradas por homens comuns, desses que andam de boné e camiseta nas ruas da cidade. Eles acham que a mulher pertence a eles, como um carro ou uma bicicleta. É uma posse que não tem direito autônomo de partir. Por isso, mais de 15 deles decidem todos os dias dar uma facada ou um tiro na mulher que não o quer mais. Esse número não cai há uma década.
Criaram-se leis para impedir a violência doméstica (como a Maria da Penha), as vítimas dão queixas na delegacia quando se sentem acuadas (Viviane fez dois boletins antes de ser morta), mas isso não detém os facínoras. Eles sentem que têm o direito de matar – uma convicção invisível que vem do berço, que é transmitida de pai para filho, que cresce nas conversas de rua e na mesa do bar. A mão do assassino é armada diariamente pela cultura que o cerca.

Mesmo assim, nem todos os homens abandonados ou contrariados agridem. Mesmo numa cultura machista, mesmo num contexto de perda de prestígio e de status social, a maioria absoluta dos homens lida com as desavenças domésticas e com as rupturas sem violência. Os assassinos e os agressores, embora sejam muitos, constituem uma ínfima minoria. Isso sugere que por trás dos desatinos homicidas existe escolha pessoal, e não apenas compulsão coletiva. A cultura brasileira talvez endosse subjetivamente a violência contra as mulheres, mas apenas uma minoria escolhe abraçá-la. Por quê?

Minha impressão é que existe um buraco nas almas masculinas. Cada um de nós tem dentro de si um ponto ao qual é possível se recolher em momentos de dor. Em muitos homens, esse lugar de recolhimento não existe. Exposto ao sofrimento, submetido ao desapontamento e a revezes emocionais, o sujeito não tem para onde correr no interior de si mesmo. Ele se vê diante de um vazio que impede o luto e a pacificação. Só há a raiva, o medo e a sensação insuportável de abandono. Como se fosse criança. A violência é a resposta primitiva a esses sentimentos intoleráveis. É o sintoma de uma espécie de doença.

Acho que na alma feminina esse buraco é mais raro, ou talvez seja menor.

De alguma forma, a cultura das mulheres, de mãe para filha, incentiva algum recolhimento e o convívio com os seus próprios sentimentos. Muitos dirão que é genético, eu creio que é ensinado. As mulheres aprendem lentamente a se conhecer melhor e a estar mais próximas dos seus sentimentos. São mais sinceras consigo mesmas, me parece. No mundo feminino, parece haver menos alienação emocional, algo que sobra entre os homens. Os rapazes - isso está documentado - têm enorme dificuldade em falar de si mesmo e dos seus sentimentos. Não se trata apenas de timidez ou indiferença. É desconhecimento. Eles não conseguem expressar o que sentem e tampouco dizer o que são. Eles simplesmente não sabem. Vivem voltados para fora. Gritam, lutam, correm atrás das garotas. Mas, dentro de si, carregam um turbilhão de emoções sem vozes. É um silêncio aterrador, que pode durar a vida inteira.
Há algo de trágico nisso. O vazio interior, a inabilidade de expressar sentimentos e a incapacidade de lidar com eles, tudo isso forma uma espécie de bomba relógio. As relações entre homens e mulheres provocam emoções intensas e potencialmente dolorosas. Precisam ser mediadas pela compreensão e pelas palavras. Quando essa mediação está ausente, fica-se à mercê de sentimentos primitivos, como o medo e a raiva. São eles que detonam a bomba da violência.

Obviamente nada disso é inevitável. No mundo inteiro os homens são homens, mas em muitas partes do planeta a epidemia de violência contra as mulheres foi eliminada. Isso tem a ver com as leis e com os costumes. Sobretudo, tem profunda ligação com a educação. Ela proporciona a melhor compreensão do mundo e de si mesmo. Ela dá voz aos sentimentos e permite que eles se articulem de forma civilizada. Ela empurra para o fundo de nós o instinto primitivo de violência. Depois de repetidas gerações de pessoas instruídas, criam-se dentro das sociedades tabus poderosos contra os abusos e o uso da força. Assim se suprime a epidemia de mortes de mulheres.

Sempre haverá facínoras e desequilibrados. De quando em quando, um homem transtornado de ciúme matará. Uma mulher enlouquecida pelo abandono matará. Um jovem sufocado em sentimentos terríveis tirará sua própria vida. Isso acontece desde o início dos tempos, em toda parte. É provável que jamais desapareça. Mas chegará um tempo, no Brasil, em que uma morte dessas causará espanto e debate. Será tão raro que as pessoas se debruçarão apiedadas sobre a tragédia. Comentarão sobre a misteriosa natureza humana, seus desvãos sem luz, seu terrível potencial para o incompreensível. Eu espero estar vivo para presenciar esse momento. Eu e milhares de mulheres que terão sido poupadas de uma morte absurda e obscena.
Ivan Martins escreve às quartas-feiras.

Sem agência bancária, cidade do Piauí cria banco local e moeda própria

Catarina CostaDo G1 PI, em São João do Arraial

Isolada dos maiores centros comerciais do Piauí, a cidade de São João do Arraial, a 253 km de Teresina, criou um banco local para contornar a falta de serviços bancários. Criado em dezembro de 2007, o "Banco dos Cocais" possibilitou o desenvolvimento econômico da região com a circulação de uma moeda própria, o "cocal".
No Piauí, 68 cidades não contam com nenhum tipo de dependência bancária, segundo dados do Banco Central. Em todo o Brasil, são 233 municípios, sendo que as regiões que mais sofrem com o problema são o Nordeste - 9,1% das cidades - e o Norte (7,6%). Já as cidades que não têm agências, mas podem ter outros serviços, como lotéricas e caixas eletrônicos, chegam a 1,9 mil em todo o país.
Emancipado em 1996 de Matias Olímpio, São João do Arraial não possuía agência bancária, o que obrigava os moradores a se deslocar até Esperantina, Região Norte do estado, a 20 km de distância. "Era difícil para se locomover, pagar uma conta e receber o pagamento. Sempre ficávamos dependendo de ir a outra cidade até mesmo para comprar roupa e alimentação, já que o comércio aqui era escasso", diz a moradora Maria Antônia.
Quando assumiu o cargo em 2005, o ex-prefeito Francisco das Chagas Lima disse que viu a necessidade de aumentar a circulação de dinheiro na cidade. Após consultar os moradores, a prefeitura constatou que a maioria das mercadorias consumidas eram compradas e produzidas fora da região, já que não havia bancos no município.
Ex-prefeito destaca importância da moeda para a cidade (Foto: Ellyo Teixeira/G1)Ex-prefeito destaca importância da moeda para a
cidade (Foto: Ellyo Teixeira/G1)
"Nessa pesquisa nós percebemos também que as pessoas necessitavam de pouco capital e isso não era interessante para os grandes bancos. Criamos primeiramente um Fundo Municipal de Apoio a Economia Solidária para arrecadar 40% da receita monetária, gerando em torno de R$ 20 mil. Em seguida, tomei conhecimento do Banco de Palmas (CE), primeira agência comunitária do país. Levei a ideia à população de São João do Arraial e, em dezembro de 2007, inauguramos o Banco dos Cocais e a moeda local", explicou.
Dinheiro começou a ser distribuído em dezembro de 2007 (Foto: Catarina Costa/G1)Dinheiro começou a ser distribuído em dezembro
de 2007 (Foto: Catarina Costa/G1)
O banco é de responsabilidade da sociedade civil, mas a prefeitura e entidades locais fazem parte do Conselho. Além da distribuição da moeda, a instituição funciona para pagar os servidores da região, arrecadar taxas públicas, como de água e energia, e distribuir benefícios como o Bolsa Família.  "Ele hoje tem reconhecimento do Banco Central, desde que circule o dinheiro somente naquela cidade. As notas distribuídas vão de C$ 0,50 a C$ 20", comentou Lima.
De acordo com a prefeitura, o crescimento da economia do município coincide com a entrada em circulação do Cocal. Somente nos dois primeiros anos de implantação da nova moeda no mercado, o banco comunitário movimentou R$ 3 milhões em cocais, o que representa 25% dos R$ 12 milhões que foram movimentados em todo o município.
O coordenador do Banco Comunitário dos Cocais, Mauro Rodrigues, destaca que, além do aumento na renda da cidade, a implantação da moeda ajudou na geração de trabalho e facilitou a vida dos moradores.
Para coordenador do Banco de Cocais, moeda local fez diferença para população (Foto: Catarina Costa/G1)Para coordenador do Banco de Cocais, moeda fez
diferença na cidade (Foto: Catarina Costa/G1)
"Hoje percebemos a movimentação de dinheiro na cidade e isso faz diferença para o comércio local, para a população. Outro fator importante é investimento feito pela instituição nos setores produtivos, especialmente com a liberação de microcrédito para a promoção de pequenos negócios", explicou o coordenador.
Hoje temos a certeza de pelo menos C$ 25 milhões circulando em São João do Arraial"
coordenador do Banco de Cocais, Mauro Rodrigues
Mauro Rodrigues lembra que, além de implantar o banco e a nova moeda, a Câmara de Vereadores aprovou na época uma lei estabelecendo que 25% dos servidores públicos do município recebessem seus salários em cocais. A medida foi proposta para evitar que servidores concursados, que vieram de outros municípios, gastassem seus vencimentos fora da cidade. Quem quiser trocar o cocal por real basta direciona-se ao banco.
Segundo o atual prefeito, Adriano Ramos, atualmente 25 mil em cocais circulam emSão João do Arraial, o que equivale a mesma quantia em real. Mesmo com instalação de uma Lotérica, de outros correspondentes bancários e surgimentos de pontos comerciais que aceitam cartão de crédito, o cocal continua sendo a moeda mais utilizada na cidade, e todos os estabelecimento o aceitam.
"O Banco de Cocais estimula a economia solidária e segura o dinheiro no município. Por conta dessas e outras vantagens vamos continuar utilizando o cocal, é um benefício que atinge a todos. Além disso, a instituição ajuda a arrecadar dinheiro da receita da prefeitura para o Fundo Municipal de Apoio a Economia Solidária, que é usado como microcrédito", declarou o prefeito.
A comerciante Giseia Maria dos Santos, proprietária de uma padaria local, contou que no início a moeda chegou a ser rejeitada por receio, mas, com o passar do tempo, percebeu a melhoria no comércio. "Muitos desconfiavam da ideia, mas, após insistência e ver que era para o desenvolvimento da cidade, acabaram aceitando. É bom trabalhar com o cocal, saber que isso movimenta a renda local e beneficiou todo mundo, especialmente nós comerciantes", lembrou.
Comerciante destaca preferência pelo cocal ao invés do real (Foto: Catarina Costa/G1)Comerciante destaca preferência pelo cocal ao invés do real (Foto: Catarina Costa/G1)
Outro que comemora a circulação da moeda é Jean Santana. Dono de um pequeno armarinho, ele destacou não ter diferença entre real e cocal, e que prefere receber o dinheiro local por questão de segurança. "Como só tem valor aqui em São João do Arraial, o número de assaltos aos estabelecimentos é quase escasso", destacou. 

O crescimento econômico contribuiu também para a abertura de novos pontos comerciais, como a instalação da loja de uma das maiores redes de departamento do Nordeste. O gerente Antônio Carlos conta que o cocal nunca gerou problema nas vendas e que a empresa já sabia do uso da moeda quando decidiu implantar o empreendimento na cidade.
Criação do Banco dos Cocais foi fundamental para circulação do dinheiro (Foto: Catarina Costa/G1)Criação do Banco dos Cocais foi fundamental
para circulação de renda (Foto: Catarina Costa)
O cocal
A moeda tem o mesmo valor do real, mas com maior poder de compra graças aos descontos oferecidos em todos os estabelecimentos comerciais do município. Se um produto custa R$ 10, pagando com a moeda social, custará C$ 9. O desconto é possível porque, para cada cocal emitido, há um lastro de um real garantido pela organização financeira comunitária.
As cédulas são estampadas com ícones da cultura e economia local, além possuir um selo que dificulta a sua falsificação. De acordo com o coordenador Mauro Rodrigues, o banco tem o custo de R$ 0,15 por moeda fabricada, além de arcar com o transporte desde Fortaleza, onde está a gráfica de confiança do Instituto Palmas, gestor e certificador de bancos comunitários no Brasil, e responsável pela impressão das notas.

"Hoje, para emitir dez mil cédulas, o custo chega a ser de R$ 5 mil. É um recurso bastante caro. Se a moeda fosse fabricada pela Casa da Moeda, nós teríamos redução dos custos, o material seria de maior qualidade. Caso tivéssemos este apoio, teríamos um avanço gigantesco tanto do ponto de vista institucional como financeiro", acrescentou Mauro.

#5: Fim

De Fernanda Torres


quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

"Não estou gostando do seu tom!"

Cristiano Araújo - Maus Bocados

Eu sei que já devo ter postado esse clipe aqui (e, by the way, ele é meio fake.. acho que é playback).. mas a música é mto boa!!!



segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

Saint Louis

A cidade fica charmosa no inverno, beem diferente de quando vim aqui a primeira vez.

Frio congelante, gelo por todo lugar. Por meia horinha nevou, e foi legal rever a neve caindo (desde 2009 em Leiden!!!).

Compras no fds, definitivamente outlets me quebram. Nem quero pensar em ir em Miami, onde os outlets dão de 10 a 0 nos do Missouri (dizem).

Amanhã começa o evento e tenho minha apresentação. Tomara que de tudo certo :)

Saint Louis, MO, 16 de fevereiro de 2013, -4 C (hoje que tá sussa, pq ontem fez -14C)

sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

A memória e o filminho brega do Facebook

CRISTIANE SEGATTO
07/02/2014 13h24 - Atualizado em 07/02/2014 13h29

O Facebook completou uma década. Faz 10 anos que o tempo ficou mais curto. Dez anos que amizades se fortaleceram ou foram estragadas para sempre. Dez anos que os comentários infelizes perderam seu lugar na vala comum do esquecimento.

O destino de todo e qualquer deslize é a eternidade numa plataforma mais duradoura que a Pedra de Roseta. Mesmo que o infeliz apague o disse, mesmo que se retrate, o estrago está feito. OK, o Facebook não trouxe só problemas. Se tanta gente não sentisse prazer em usá-la, a rede social não seria o sucesso que é.
Nesta semana, muitos adeptos se emocionaram com o novo brinquedinho oferecido pela empresa. Uma retrospectiva em vídeo personalizada mostra alguns dos fatos mais marcantes da vida de quem usou o Facebook nos últimos dez anos.

O resultado é piegas, como muitas de nossas postagens. O filminho é brega como a vida. Espiei o meu e, confesso, fiquei tocada ao rever momentos importantes para mim.
O Facebook sabe disso. Se tem uma coisa da qual essa empresa entende é de comportamento. Sabe emocionar, engajar e viciar.

Não tive coragem de compartilhar meu vídeo. Ninguém merece ver uma história que só interessa a quem a viveu. Seria impingir aos meus amigos o desconforto que sentia quando era obrigada a frequentar festinhas em buffets infantis.
Você está ali, num barulho infernal, tentando desgrudar do dente uma daquelas terríveis bolinhas de queijo -- parentes distantes e desvirtuadas da coxinha de galinha. Ainda é obrigada a dar atenção ao pai do coleguinha da sua filha que se sentou ao seu lado.

O mala insiste em falar das vantagens de seu Grand Cherokee numa cidade abarrotada de carros. Enquanto pensa que “quanto maior o carro, pior a pessoa”, começa o tormento master. Um filme longo, mal feito, com uma musiquinha melosa apresenta os grandes momentos da vida do aniversariante. Thanks, God. Os filhos crescem.
É impressionante a tendência do ser humano de olhar o passado com excessiva generosidade. O Facebook deita e rola. Está sempre pronto a fornecer ferramentas que reforçam essa característica tão humana. Fotos postadas por colegas da juventude na sua linha do tempo (quase sempre sem a sua autorização prévia) estimulam o saudosismo.

Muita gente sofre com pensamentos do tipo: “Ah, como eu era magro”; “Nossa, como eu era cabeludo”; “Ah, por que deixei escapar o amor da minha vida?”; “Como éramos felizes naquele emprego”.
A memória é uma eterna traidora. Aquelas cenas que juramos relembrar vividamente não passam de edição. Não são editadas apenas pelo Facebook. São editadas o tempo todo, naturalmente, pelo nosso cérebro.

Um exemplo dessa edição foi demonstrada por pesquisadores da Universidade Northwestern, em Chicago, num estudo publicado nesta semana no Journal of Neuroscience.
O cérebro edita o passado. Bem melhor que o Facebook. O trabalho desses cientistas é o primeiro capaz de demonstrar como a memória pega fragmentos do presente e os adiciona nas lembranças do passado.

“A noção de que a memória é perfeita é um mito”, diz o professor de neurologia Joel Voss, orientador do estudo. “Todo mundo gosta de pensar nela como essa coisa que nos faz recordar vividamente de nossa infância ou do que fizemos na semana passada”, diz Voss.
Não é bem assim. A memória não recupera cenas do passado com a acurácia de uma câmera de vídeo. Ela atualiza as lembranças com novas experiências. Voss explica que uma região do cérebro chamada de hipocampo atua como um editor de filme ou diretor de efeitos especiais.

Esse mecanismo existe para nos ajudar a sobreviver e a nos adaptar a ambientes que mudam constantemente. Ele também nos ajuda a focar nas coisas que realmente são importantes no presente.
“A memória é planejada para nos ajudar a tomar boas decisões a cada momento. Por isso, ela precisa estar sempre atualizada. A informação que é relevante agora pode substituir a do passado”, diz Voss.

No estudo, o objetivo dos pesquisadores era identificar o exato momento em que uma informação incorreta é implantada numa lembrança. No experimento, eles pediram a 17 homens e mulheres que estudassem a localização de 168 objetos numa tela de computador com fundos diferentes (uma cena do fundo do mar, a vista aérea de uma fazenda etc).
Em seguida, os participantes foram convidados a colocar o objeto no lugar original, mas numa tela com um fundo diferente.

Depois, o mesmo objeto foi apresentado aos voluntários em três lugares na tela original. Aí eles foram convidados a escolher a localização correta entre três opções: o local onde eles viram o objeto originalmente; o lugar que eles escolheram colocar o objeto na etapa anterior e uma localização completamente nova.
Os participantes sempre colocaram o objeto no local que eles escolheram durante a segunda parte do teste. “Isso sugere que a lembrança original mudou para refletir a localização da qual eles se lembraram na tela com o fundo novo, diz a pesquisadora Donna Jo Bridge.

“A memória deles atualizou a informação incluindo a nova informação na lembrança antiga”, diz Donna. “Nossa memória remonta e edita acontecimentos para criar uma história que faça sentido no mundo atual. A memória é construída para ser atual”.
Durante o teste, a atividade cerebral dos voluntários foi monitorada por meio de equipamentos de ressonância magnética. É claro que o estudo tem limitações. É um trabalho de laboratório, mas não é absurdo pensar que a memória funciona da mesma forma no mundo real.

Os pesquisadores acreditam que o trabalho pode até mesmo levantar questões sobre a confiabilidade dos depoimentos de testemunhas em processos judiciais. “Nossa memória é construída para mudar, não para regurgitar fatos. Não somos testemunhas muito confiáveis”, diz Donna.
O estudo também pode nos levar a repensar a importância de momentos marcantes na nossa vida. O amor à primeira vista, por exemplo, parece ser mais um truque da memória.

“Quando você pensa no momento em que encontrou seu parceiro atual, provavelmente você relembra o sentimento de amor e euforia”, diz Donna.
Segundo ela, isso ocorre porque projetamos o sentimento atual sobre a lembrança do encontro original com a pessoa amada.
 
O cérebro deixa para trás o que é descartável. Reinterpreta o que precisa ser reinterpretado para que a gente possa seguir em frente. Livra-se com facilidade do excesso de bagagem. Se o passado foi bem vivido, ótimo. Se não foi, bola para frente. Não permita que ele estrague o presente. Até porque a leitura que fazemos do passado pode não ser muito fidedigna.

Ao contrário do nosso cérebro, o Facebook eterniza toda e qualquer trolha. Traz de volta o que não interessa mais. A vida muda, seu cérebro se adapta. Recupera e edita só o que interessa. Bem que o Facebook poderia deixar o passado descansar em paz.
(Cristiane Segatto escreve às sextas-feiras)

Dedo podre

IVAN MARTINS
12/02/2014 09h05 - Atualizado em 12/02/2014 09h08

Chega um momento da vida adulta, depois de um ou dois tropeços, em que somos obrigados a refletir sobre as nossas escolhas afetivas. Para um amigo de quem eu gosto muito, esse momento chegou por volta dos 35 anos, quando ele percebeu que estava sofrendo – de novo – por uma mulher que não gostava dele. Num momento de lucidez, ele se deu conta de que havia um padrão no seu comportamento, e que ele levava, invariavelmente, a um pé na bunda. Na dele.
Começo com essa história corriqueira para falar daquilo que chamam de “dedo podre”, a capacidade que têm algumas pessoas, homens e mulheres, de escolher sempre o parceiro errado.
Há muitas pessoas assim. Elas não têm sexo, idade ou tipo físico determinado. Nem o temperamento delas é parecido. Em comum, têm apenas essa terrível inclinação a se ligar emocionalmente a gente inviável – que, por uma razão ou por outra, é incapaz de manter com elas o tipo de relação que elas gostariam de ter.

Eu não sei como esse dedo aparece, mas tenho algumas suspeitas.
Ao contrário do que se diz, minha primeira impressão é que não se trata apenas de azar. Se o primeiro namorado da Fulana era um malandro mentiroso, o segundo um psicopata ciumento e o terceiro ainda está apaixonado pela ex-mulher, não dá para culpar a falta de sorte. Fulana, claramente, não sabe escolher. Continua sendo uma coitadinha, mas a responsabilidade é dela, não do destino.
Suspeito que por trás de cada escolha equivocada exista sempre uma alma carente. É óbvio, né? Quem precisa demais da atenção dos outros não consegue julgar ninguém direito. A pessoa se agarra ao primeiro que passa, cai na primeira conversa que escuta, se apaixona por qualquer um. Falta critério a quem precisa demais de carinho. Gente assim torna-se extremamente vulnerável. Vira uma presa fácil dos truques, desmandos e caprichos dos outros.
Além da carência, há o velho problema da autoestima. Ou da falta dela. Quem gosta de si mesmo fica melhor sozinho, quem gosta de si mesmo procura gente que lhe faz bem, quem gosta de si mesmo busca uma pessoa especial, porque sente que merece. Quem não se gosta faz tudo ao contrário.

Tempos atrás, uma analista me disse que a pessoa que a gente escolhe diz muita coisa sobre nós. Ela conta, sobretudo, como vemos a nós mesmos. Faz sentido, não?
Alguém que se envolva sistematicamente com tranqueiras está informando ao mundo que não se acha melhor do que aquilo. Gente que se deixa maltratar e humilhar anuncia aos quatro ventos que não tem respeito por si mesmo. O contrário também é verdadeiro. Quando alguém que conhecemos aparece ao lado de uma pessoa alegre, altiva e generosa, quando exibe uma relação apaixonada e sólida, nossa impressão sobre ele ou sobre ela cresce. Nem poderia ser de outra forma. Diga-me com quem dormes e te direi quem és. Ou, pelo menos, como te imaginas.

Antes de encerrar, eu queria deixar claro que não acho que escolher seja fácil. Sobretudo no mundo em que a gente vive. Há gente demais à nossa volta, as opções são muitas e a confusão é enorme. Ao contrário do que diz aquele juiz de futebol na televisão, as regras não são claras. Mas, se a vida não oferece garantia contra enganos, ela nos dá alguma inteligência para perceber quando eles estão se repetindo. Isso nos permite tomar providências.
Por ter vivido e observado, sei que “dedo podre” tem cura. Não é como aquela dor no baço da adolescência, que simplesmente passa. Carência, falta de autoestima e ausência de ambição sentimental (“pra mim, qualquer um serve”) têm de ser ativamente combatidas. Com ajuda externa, se necessário.

O amigo a que eu me referia no início desta coluna fez anos de análise para colocar seus sentimentos no lugar. Demorou, mas um dia percebeu os fatos elementares da vida amorosa: não existe amor sem reciprocidade, não há vida comum sem afinidade, o desejo não compensa sofrimento. Com isso, o dedo podre dele ficou no passado. E o seu?
Ivan Martins escreve às quartas-feiras.

quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

A intolerância ou o shopping e o aeroporto

Por Angela Alonso
No ponto de ônibus, o comercial da Fifa apela para "Star Wars": um time de futebol formado pelo robozinho C3PO e soldados da força de paz intergaláctica, anuncia que todos são bem-vindos à Copa. O cartaz evoca a longeva autoimagem dos brasileiros como tolerantes. A ideia de que aqui os conflitos não grassam com a força que ganham noutras partes é antiga. Por exemplo, quando tensões entre regiões ameaçaram seriamente cindir o país, no Império, formou-se um governo autointitulado "Conciliação".
A imagem se repete em escritos de intelectuais e discursos de políticos ao longo do tempo. Para ficar numa versão clássica, Gilberto Freyre argumentou que aqui vivemos num delicado e profícuo "equilíbrio de antagonismos". Isto é, enquanto noutras partes diferenças éticas e religiosas e subordinações sociais geram guerra aberta entre grupos, aqui a sociabilidade amornaria o conflito. Nosso jeitinho, o pendor para o diminutivo, para pessoalizar em vez de ir à regra, teriam tornado suportáveis e até amenas desigualdades sociais tão pronunciadas. Assim é que a empregada da casa é "quase uma pessoa da família", em linha com os escravos domésticos do Império. O "quase" aí faz a diferença. Indica que a distância entre uns e outros parece se anular, mas segue resguardada. Há afeto, desde que haja subordinação.
Esta elisão simbólica das diferenças via relações sociais funcionou longamente como colchão de amortecimento para desigualdades e hierarquias e ajudou a reproduzi-las. O mesmo se pode dizer da ascensão social pelo "talento". Louva-se a ida aos céus de alguns, por "excepcionais" - por exemplo, Silvio Santos, Lula, Pelé, Joaquim Barbosa -, apresentados como exemplares da possibilidade de ascensão para todos, independente de origem social, regional ou étnica.
A tolerância à brasileira pressupõe subordinação
Mas como fica esse princípio de tolerância quando, em vez de indivíduos avulsos, que surgem de tempos em tempos, há uma multidão de ascendentes simultâneos? No mínimo, o princípio trinca. Está às escâncaras o incômodo que esta ascensão produz nos estratos mais altos. Isto se viu nos shoppings, com os rolezinhos, como nos aeroportos, que, na opinião de uma professora universitária - veiculada nas redes sociais -, decaíram a rodoviárias. O incômodo assoma no espaço público, onde não se pode ignorar a presença ostensiva do que uma moradora de Higienópolis nomeou tempos atrás de "gente diferenciada".
Não cabe aqui discutir os mecanismos que possibilitaram o ingresso de milhões no universo do consumo, mas o fato é que, nos últimos anos, um estrato inteiro ascendeu. Mudança para a qual o bordão do ex-presidente, "nunca antes na história deste país", não exagera. O fenômeno vem sendo nomeado como "classe C". Termo impreciso porque se designa como classe grupo muito heterogêneo a partir de sua renda, quando classe designa sobretudo a partilha de uma experiência social, de um conjunto de vivências para além do consumo, que incluem formas de pensar, agir, sentir, se expressar. Não menos relevante, classe é um conceito relacional, existe por diferenciação e antagonismo, uma só tem sentido em relação a outra.
Por isso, usualmente, quando a distância social entre grupos diminui, os mecanismos de distinção social se sofisticam. Norbert Elias mostrou como isso aconteceu com a nobreza de corte francesa no século XVIII, que foi inventando maneiras cada vez mais rebuscadas de autoapresentação, uma etiqueta de difícil reprodução pelos ascendentes sociais. Pierre Bourdieu, tratando da França já no século XX, apreendeu o mesmo processo até no gosto artístico. Estudos deste tipo mostram que os grupos mais altos na hierarquia social, quando se sentem ameaçados, buscam novas formas de distinção, que podem ser novas formas de desigualdade.
Entram então em disputa os símbolos que permitem a cada indivíduo se localizar na hierarquia social. Parece que, no nosso caso, os shoppings e os aeroportos se revelaram dois espaços icônicos, por meio dos quais os grupos mais altos se distinguiam com clareza meridiana dos mais baixos. Consumo e viagens eram estratégias para demonstrar refinamento, sofisticação e traçar a linha entre elite e populacho. Mas quando muitos podem ter diploma universitário, comprar grifes e ir a Nova York, o prestígio que se auferia com essas prerrogativas se esmaece. O Tratado de Tordesilhas social, que divide os grupos, entra em risco. Agora é preciso diplomas com grife, shoppings "exclusivos", destinos exóticos, para não se confundir com a "massa".
Quando a renda por si não separa com nitidez, passam a relevantes formas sutis de diferenciação, como as maneiras - o modo de falar, andar, vestir - e os gostos - o musical, por exemplo. No caso dos rolezinhos e dos aeroportos, isto está no fulcro das reações. A tentativa dos shoppings de discriminar quem entra ou não se valeu desses critérios, os mesmos da professora da PUC em seu comentário jocoso no Facebook ("aeroporto ou rodoviária?") sobre a vestimenta de um passageiro de avião. O juízo estético opera como meio de exclusão, aponta a inadequação da posição social desses indivíduos. Supõe-se que ali estão por transgressores. Estão fora do lugar.
Aí voltamos à tópica do país sem preconceito, que está na propaganda da Fifa. A tolerância à brasileira vicejou enquanto a subordinação de certos grupos a outros estava não só bem definida no âmbito da economia como no dos costumes. Agora que estas distâncias encurtaram - e olha que seguem enormes -, a tolerância encurtou também. As reações exasperadas dos frequentadores usuais de shoppings e aeroportos em relação aos novos usuários o evidenciam. A visibilidade dos antes invisíveis, da "gente diferenciada", soa como insubordinação para grupos que se sentem ameaçados, a ponto de apelarem para a violência física, como em episódios homofóbicos recentes e no quase linchamento de um jovem negro.
Soa paradoxal que num país no qual já se pediu tanto por inclusão, por expansão de direitos e de prerrogativas, agora assomem no espaço público estas demandas por exclusão. Mudança gera conflito, mas não precisa gerar intolerância.
Angela Alonso é professora livre-docente de sociologia da USP, diretora científica do Cebrap e colunista convidada do "Valor". César Felício volta a escrever em março
E-mail: amalonso@usp.br


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Fds!!

Medo

Ok, eu acho essas coisas de Astros e Zodíaco uma bobagem (exceto os Cavaleiros do Zodíaco). Mas acabei de abrir a Folha despretenciosamente, para ler as manchetes..

E eis o que surge na previsão para Aquário hoje!

Aquário (21 jan. a 19 fev.)

Carga de trabalho grande, responsabilidades assumidas do passado idem - elas pesam, e você anda cansado, disposto a acabar com isso. Se já deu alguns passos, espere; volte à ação a partir de 28/2. Mau contato com pessoas poderosas - dias de humilhação acontecem.

A msg mais paia do aniversário

Viado... acho paia dormir na virada do niver... amanha eu te ligo

(Igor)

A msg mais legal de aniversário

Meu amor, sei que pode nem estar parecendo, mas hoje é o seu aniversário. (Afinal, hoje é 6 janeiro de 2003. Ops!) Afinal, hoje é 13 de fevereiro de 2014. 

Mais um ano da sua vida se inicia hoje e ele tem de tudo pra ser do-do-do-doce que nem caramelo.

Você é uma pessoa maravilhosa e não só pelo cheiro de rosa de avelã, mas também pela alegria, pelo caráter, pelo companheirismo e pela pureza de um anjo querubim. Até Dona Geni sabe que você está estourado.

Me sinto muito grata por você fazer parte da minha vida. Eu já não me imagino sem você, meu bem querer, amor pra sempre. 

Desejo-lhe que o remédio que cure esta saudade que em nosso peito invade seja possível em breve. Afinal, do que vale o dinheiro se não compra o amor. 

Que os tempos dos maus bocados fiquem para trás e dêem espaço para tempos de paz e amor. 

É claro que não pode faltar um baldinho de cachaça na área VIP reservada, pois são só 27 anos. 

Parabéns!!!

Te amo 😍❤😍
Ana

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

A vida como ela é

Ainda que nem sempre nos demos conta, todos os dias o mundo a nossa volta nos convida a contemplar as evidências da passagem dos anos, a partir da reflexão a respeito de hábitos e objetos que caíram em desuso ou então que se extinguiram de maneira natural. Foi assim, por exemplo, com a antes onipresente máquina de escrever, até que perdesse seu reinado de décadas como utensílio indispensável para o postulante computador pessoal e seu mirabolante editor de texto digital, que assegurava nada menos do que a possibilidade ilimitada de erros de datilografia; ou, mesmo antes disso, com a caneta tinteiro, compulsoriamente aposentada pela escrita suave, prolongada e asséptica das esferográficas.
De maneira análoga, hoje pela manhã, uma breve passagem pelo aeroporto me fez atentar para o processo de paulatina extinção ao qual se submete um costume que, durante muito tempo, representou em nossa sociedade o suprassumo da anarquia e da liberdade de expressão: o ato de escrever mensagens em portas de banheiro. Lembro-me com carinho dos áureos dias em que, ainda criança, recorria a esta verdadeira bíblia do lado selvagem da vida para compreender toda gama de temas que a TV, meus pais e a escola tentavam encobrir.
Era nos compartimentos individuais dos sanitários de shoppings, cinemas, clubes, restaurantes de reputação duvidosa e afins – graças a sagacidade daqueles que se dividiam entre satisfazer suas necessidades fisiológicas e o anseio por expressão – que recebíamos esclarecedoras lições sobre anatomia humana, vocabulário de baixo calão e a reputação condenável de desconhecidos. Podem me tachar de saudosista, mas confesso que me ressinto de não mais viver numa época em que uma das piores ofensas que se podia fazer a alguém era associar, na porta de um banheiro público, seu nome e telefone a práticas sexuais pouco ortodoxas.
Claro que não se pode esquecer das mensagens de caráter político, aos moldes deste hoje em dia raríssimo exemplar registrado na foto que ilustra o post, em que o autor sugere uma invasão norte-americana como solução para  ”melhorar” o Brasil, e que contou, inclusive, com a discordância em fora de réplica de um outro usuário do mesmo vaso. Concordemos ou não com a opinião do sujeito, reconheçamos, eis aí a beleza do exercício da democracia.
Assim como máquinas de escrever e canetas tinteiro, estes artesãos do conhecimento marginal também se tornaram obsoletos, cedendo lugar a um perfil que, ao contrário de seus antecessores, dispõe de inúmeras possibilidades para dizer o que pensa, e que talvez, por conta disso, acabou perdendo um pouco de sua relevância. Do alto do aconchego de seus lares, a salvo da caçada implacável de seguranças e serventes, este exército de opinadores, independente do grau de conhecimento que tenham sobre o tema, pode ser visto atuando em fóruns virtuais, postagens de Facebook e sessões de comentários de portais de notícia, quase sempre reforçando o argumento de quem, como eu, pensa que a internet se transformou num gigantesco banheiro de infinitas portas.