Dilma Rousseff é mulher. A obviedade ganhou profundidade depois da
última pesquisa CNI Ibope. Além de apontar aprovação recorde da
presidenta, de 77%, a pesquisa deixou claro também que o fato de Dilma
ser a primeira presidente da República mulher tem consequências maiores
do que se imaginava.
"Programas sociais e ações voltadas para mulheres" foi o assunto mais
lembrado espontaneamente pelos entrevistados sobre o governo dela. Se
Lula tinha seu carisma popular (misturando Tiririca com Getúlio Vargas),
Dilma pode usar o fator feminino num país machista para sensibilizar o
maior segmento da população e do eleitorado: o segmento feminino.
Mas Dilma parece pouco inclinada ao personalismo político até aqui.
Governa com uma falta de carisma e pessoalidade que contrasta totalmente
com seu predecessor e padrinho. Enquanto Lula fazia amigos numa viagem
de elevador, Dilma tem fama de poucos amigos. Muito da tal crise
política vem do fato de Dilma fugir dos aliados, enquanto Lula corria a
abraçá-los.
Essa impessoalidade e rispidez no trato, tudo o que homens de marketing e
comunicação não recomendam, agradam os brasileiros, já que eles aprovam
a presidenta como nunca aprovaram um presidente. E quando Dilma trata
mal os políticos, convenhamos, ela está totalmente alinhada com o desejo
da imensa maioria.
Claro, a alta aprovação de Dilma está acima de tudo ligada à alta
aprovação do modelo econômico capitalista consolidado no Brasil pelo PT,
era isso também que mais explicava a popularidade de Lula.
Vivi o suficiente para saber que vivemos o melhor momento da história do
Brasil. Os números atestam isso. O ânimo da população atesta isso.
Outro dia outra pesquisa apontou os brasileiros como os mais felizes do
mundo. A explicação é tão fácil: renda e emprego estão no pico, o país
vive um momento transformador, a emergência do mercado interno
brasileiro era o passo que faltava para o amadurecimento socioeconômico
do país, existe a sensação de que finalmente encontramos um caminho para
a prosperidade. E apesar dos enormes problemas e ineficiências, essa
ascensão está apenas no começo, desculpem meu otimismo.
Dilma sucede dois presidentes, Lula e FHC, que eram os melhores quadros
de seus grupos políticos e as maiores lideranças da geração pós-64.
Sabiamente eleitos pelos brasileiros, os dois são os pais-fundadores do
novo Brasil, capitalista e democrático.
Nessa narrativa épica de renascimento nacional, Dilma é uma personagem
acidental. Não era política, está no cargo apenas pelo dedaço astuto de
Lula.
Acidentalmente, ela governa o Brasil no pico de nossa força, o que é uma
ironia da história e também é útil. Para que o sucesso brasileiro não
seja creditado a Dilma, como o PT o creditava a Lula.
A falta de carisma e personalismo de Dilma ressalta que o sucesso do
Brasil é dos brasileiros, não de um grupo ou de um líder político. Dilma
marca essa transição para a normalidade. A normalidade dos gerentes.
O que chama atenção mesmo é o fato de ela ser mulher.
Sérgio Malbergier é jornalista. Foi editor dos cadernos
"Dinheiro" (2004-2010) e "Mundo" (2000-2004), correspondente em Londres
(1994) e enviado especial da Folha a países como Iraque, Israel e
Venezuela, entre outros. Dirigiu dois curta-metragens, "A Árvore"
(1986) e "Carô no Inferno" (1987). Escreve para a Folha.com às quintas.
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