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Quando a “Enciclopédia Britânica” anunciou a extinção de sua edição em papel, uma instituição que durou 244 anos após a publicação de seu exemplar inaugural, o comunicado fez a Barsa – espécie de versão brasileira e mais jovem da obra – soltar um informe dando conta de que por aqui nada muda. E que, nesta primeira semana de abril, está sendo lançada a coleção 2012: são 18 volumes impressos, com cerca de 135 mil verbetes, ao todo. Enquanto a matriz estrangeira justifica-se citando o investimento nos serviços online, a Barsa apresenta a “credibilidade” e a “segurança” como argumentos centrais para a manutenção dos livros de papel mesmo.
São os estudantes o público preferencial da enciclopédia. Ou os pais desses estudantes, explica ao G1 a diretora de treinamento e marketing do Grupo Barsa Planeta, Sandra Cabral. “As escolas começaram a proibir o copy e paste”, diz ela, referindo-se à prática de reproduzir indiscriminadamente, em trabalhos do colégio, o conteúdo de sites. “Esse ‘control C + control V’ fez [surgir] uma geração de crianças sem discernimento, um analfabetismo funcional mesmo. Elas leem, mas não interpretam.”
Existe, ainda, um apelo não só ao zelo, mas à nostalgia desses pais. É gente que, em sua época de escola, não pôde comprar a Barsa. E que, agora, vê a oportunidade de satisfazer o desejo, nem que tardiamente e por meio dos filhos. A gerente financeira Rosana Menegazzi, 43, de São Paulo (SP), é um exemplo. Mãe de Vinícius, 16, e Victor, 12, ela comprou a coleção há quatro anos. “Era até um sonho de consumo, porque, quando era mais jovem, as condições financeiras não permitiam. É óbvio que, quando você tem uma fonte de pesquisa [de referência], você tem mais segurança.”
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Parcelas
Para ampliar a área de atuação, a editora decidiu, há dois anos e meio, dar a opção de pagamento em 24 parcelas – antes, o limite eram 12. Assim, chegou-se à classe C, observa Sandra: “Houve um boom. Você trabalha com uma parcela que cabe no bolso [do comprador], o que fez com que aumentassem muito as vendas. Saímos da faixa de 50 mil por ano para 70 mil”. O crescimento anual das vendas no período tem sido de 10%.
A assessoria de imprensa do Grupo Barsa Planeta calcula que 70% de seu comércio acontece em esquema “porta a porta”, com 1.800 vendedores em 14 filiais pelo Brasil. Um deles é Fernando Forster, de São Paulo, que entrou na empresa aos 20 anos de idade, em 1980, por indicação do pai, também ele vendedor. “O cliente que compra a Barsa não mudou nesses 30 anos. É o cliente que se interessa em dar uma boa educação, que quer que o filho investigue por ele mesmo as informações”, afirma Forster ao G1, repetindo o discurso habitual feito diante de um possível comprador. “A internet tem muita coisa boa, mas muita coisa ruim também. Os pais ficam preocupados.”
Para ampliar a área de atuação, a editora decidiu, há dois anos e meio, dar a opção de pagamento em 24 parcelas – antes, o limite eram 12. Assim, chegou-se à classe C, observa Sandra: “Houve um boom. Você trabalha com uma parcela que cabe no bolso [do comprador], o que fez com que aumentassem muito as vendas. Saímos da faixa de 50 mil por ano para 70 mil”. O crescimento anual das vendas no período tem sido de 10%.
A assessoria de imprensa do Grupo Barsa Planeta calcula que 70% de seu comércio acontece em esquema “porta a porta”, com 1.800 vendedores em 14 filiais pelo Brasil. Um deles é Fernando Forster, de São Paulo, que entrou na empresa aos 20 anos de idade, em 1980, por indicação do pai, também ele vendedor. “O cliente que compra a Barsa não mudou nesses 30 anos. É o cliente que se interessa em dar uma boa educação, que quer que o filho investigue por ele mesmo as informações”, afirma Forster ao G1, repetindo o discurso habitual feito diante de um possível comprador. “A internet tem muita coisa boa, mas muita coisa ruim também. Os pais ficam preocupados.”
De acordo com ele, a notícia sobre a Britânica teve um efeito colateral positivo, fez reavivar o interesse pela Barsa. “Ajudou demais”, comemora, “porque o cliente ficou com medo [de deixar de existir em papel]”. “Parte do público das classes C e D já está conseguindo ter acesso à Barsa. Nunca foi uma obra de elite, mas sempre foi cara. Hoje, uma TV de LCD de 42 [polegadas] mais ou menos se equipara ao valor de uma Barsa. É na faixa de R$ 3 mil a R$ 4 mil, a variação é em função da encadernação.”
A nota da editora acrescenta a seguinte distribuição: “hoje a região que mais consome o produto enciclopédia do Grupo Barsa Planeta é a Norte. No sudeste, os estados de Minas Gerais e Espírito Santo apresentam bom desempenho. Em São Paulo e Rio de Janeiro, o comércio mantém-se estável”.
Colaboradores ilustres
Em sua defesa, Forster e Sandra Cabral poderiam recorrer à Wikipédia, a enciclopédia livre e colaborativa que existe na internet e, com frequência, é usada como fonte de referência. No verbete sobre a “Barsa”, está dito que ela foi lançada em 1969. Instada a ler o conteúdo, a diretora de marketing aponta um equívoco: “Realmente há uma divergência na data, a primeira edição foi lançada em março de 1964”. Um argumento a mais para quem defende a pesquisa na solidez do papel.
O restante das informações do site, no entanto, tem validade – o projeto Barsa nasce mesmo 1959, concebido por Dorita Barrett, herdeira da Britânica. Sandra relembra que Dorita, vivendo no Brasil, recusou a ideia de promover uma tradução, para o português, do original. Em vez disso, convocou-se um time formado, dentre outros ilustres, por Antonio Houaiss (1915-1999), o do dicionário; Antonio Callado (1917-1997), jornalista e escritor; Jorge Amado (1912-2001), também escritor; e Oscar Niemeyer, o arquiteto que projetou Brasília. Todos escreveram textos para aquela primeira edição, cuja leva inicial, de 45 mil exemplares, esgotou-se em oito meses. “Sem nenhuma propaganda”, adverte Sandra. “Era aquilo de os intelectuais quererem uma enciclopédia brasileira...”
Em sua defesa, Forster e Sandra Cabral poderiam recorrer à Wikipédia, a enciclopédia livre e colaborativa que existe na internet e, com frequência, é usada como fonte de referência. No verbete sobre a “Barsa”, está dito que ela foi lançada em 1969. Instada a ler o conteúdo, a diretora de marketing aponta um equívoco: “Realmente há uma divergência na data, a primeira edição foi lançada em março de 1964”. Um argumento a mais para quem defende a pesquisa na solidez do papel.
O restante das informações do site, no entanto, tem validade – o projeto Barsa nasce mesmo 1959, concebido por Dorita Barrett, herdeira da Britânica. Sandra relembra que Dorita, vivendo no Brasil, recusou a ideia de promover uma tradução, para o português, do original. Em vez disso, convocou-se um time formado, dentre outros ilustres, por Antonio Houaiss (1915-1999), o do dicionário; Antonio Callado (1917-1997), jornalista e escritor; Jorge Amado (1912-2001), também escritor; e Oscar Niemeyer, o arquiteto que projetou Brasília. Todos escreveram textos para aquela primeira edição, cuja leva inicial, de 45 mil exemplares, esgotou-se em oito meses. “Sem nenhuma propaganda”, adverte Sandra. “Era aquilo de os intelectuais quererem uma enciclopédia brasileira...”
De lá para cá, a Barsa enfrentou épocas pouco favoráveis, como quando, nos anos 1990, o público deixou-se seduzir por mídias como disquete e CD-ROM. Ou, antes ainda, na década anterior, quando apareceu o videocassete. Quem se lembra desse “inimigo” incomum é Guiomar Trindade Motta, 63, vendedora da enciclopédia desde 1985. “Ele atrapalhou, desviou [a atenção]. As pessoas diziam: ‘Não vou comprar a Barsa, porque vou comprar o vídeo’. E não tinha nada a ver uma coisa com a outra...”.
Guiomar, contudo, esclarece que seus principais compradores são escolas, em especial as de Teresina (PI). Ela, que é de São Paulo, faz visitas frequentes ao estado. Também gostava de trabalhar nos estandes em aeroportos, onde diz ter atendido clientes como Fafá de Belém, Lima Duarte, Miguel Falabella e Roberto Pompeu de Toledo, escritor e colunista da revista “Veja”. Outros compradores da Barsa são instituições públicas, como bibliotecas, órgãos do governo ligados à educação.
Estratégia
Hoje, quem compra a Barsa leva, além dos 18 volumes, um DVD, que garante atualizações regulares de conteúdo, e acesso ao site Barsa Saber. “O que não queremos é esperar o livro morrer para vir com outra tecnologia. Então, estamos melhorando cada vez mais o eletrônico. E estamos em desenvolvimento de aplicativos para o tablet”, antecipa Sandra Cabral. “Para nós [da Barsa], no dia em que o mercado não quiser os volumes, estaremos consolidados no eletrônico. Ou na rede. É o que a ‘Britânica’ fez, uma estratégia de negócio totalmente pensada. Não foi um modelo de negócio que resolveram da noite para o dia.”
Hoje, quem compra a Barsa leva, além dos 18 volumes, um DVD, que garante atualizações regulares de conteúdo, e acesso ao site Barsa Saber. “O que não queremos é esperar o livro morrer para vir com outra tecnologia. Então, estamos melhorando cada vez mais o eletrônico. E estamos em desenvolvimento de aplicativos para o tablet”, antecipa Sandra Cabral. “Para nós [da Barsa], no dia em que o mercado não quiser os volumes, estaremos consolidados no eletrônico. Ou na rede. É o que a ‘Britânica’ fez, uma estratégia de negócio totalmente pensada. Não foi um modelo de negócio que resolveram da noite para o dia.”
Por enquanto, a alegação comum aos representantes da Barsa consultados pelo G1 é a esta: ao pesquisar em livros, a pessoa não perde a “concentração”, na medida em ali não se pode vagar de link em link, como na internet. É um raciocínio que vai ao encontro dos textos do pesquisador americano Nicholas Carr, que escreve sobre tecnologia e cultura.
Em “Geração superficial – O que a internet está fazendo com nossos cérebros” (Agir, 2011), ele avalia: “A mente linear, calma, focada, sem distrações, está sendo expulsa por um novo tipo de mente que quer e precisa tomar e aquinhoar informação em surtos curtos, desconexos, frequentemente superpostos – quanto mais rapidamente, melhor”. Ironicamente, Carr é membro do conselho editorial de consultores da “Enciclopédia Britânica”.
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