quarta-feira, 16 de abril de 2014

Vale o quanto pesa?

Por Bruno Medina

Nestes dias que antecedem a Páscoa, como evitar a frustrante sensação de deparar-se com ovos de chocolate de todas as cores, sabores e tamanhos por onde quer que se vá para, no instante seguinte, constatar que o tradicional quitute, que sempre foi doce, há muito transformou-se numa iguaria de preço um tanto quanto salgado? Trocadilhos à parte, se repararmos bem, fato é que já se vão longe os anos em que era costume distribuir ovos de Páscoa entre parentes e amigos, visto que, de uns tempos para cá, comprar apenas dois ou três deles já pesam em qualquer orçamento.
Apesar de estar certo de que ninguém nunca se deu ao trabalho de mensurar isso, se a evolução no preço dos ovos fosse comparada ao de ações de uma empresa na bolsa, é bem provável que teriam ultrapassado o Google. Seguindo mesmo raciocínio, se ao invés de apostar na extração de petróleo e minério Eike Batista tivesse investido ao menos uma parte de sua fortuna em ovos de Páscoa, seguramente não estaria hoje à beira da bancarrota. Eu sei, chega a soar inocente em plena sociedade de consumo alguém vir a público questionar o sagrado princípio da oferta e da procura, afinal, quase tudo neste mundo que é escasso ou sazonal está sujeito a elevações significativas de preço, são as regras do jogo.

Me pergunto, no entanto, que argumentos seriam capazes de justificar, frente ao incauto consumidor, uma variação de cerca de 650% entre as versões barra e ovo de um mesmo chocolate, conforme evidenciado por uma campanha que no início deste mês se espalhou pelo Facebook? Em sua defesa, fabricantes alegam custos extras relacionados à contratação de mão de obra temporária, processos de embalagem manuais e necessidade de armazenamento e transporte diferenciados, mas a gente continua preferindo acreditar na perspectiva de lucros estratosféricos como razão principal que motiva a escalada indecente de valores.

Dada a impiedosa lógica capitalista, que nesta época do ano impõe seu manto negro e soberano sobre vovós afogadas em empréstimos consignados e netinhos que anseiam por chafurdar-se em montanhas de ovos de chocolate, que outra alternativa nos resta a não ser a de costume? Improvisar, meus caros, é a única saída para sobreviver à Páscoa sem perder as calças. Neste sentido, algumas dicas valiosas podem ser seguidas, a fim de evitar que, além dos ovos, o coelhinho esconda também o saldo da sua conta bancária.

A primeira delas seria recorrer aos ovos quebrados, que comumente são vendidos bem abaixo do preço original. Lembre-se de que é sempre possível alegar a freada dentro do ônibus ou o tropeço nos degraus da portaria como explicação para o estrago. Uma segunda opção, claro, seria ligar dizendo que está acorrentado ao vaso, vítima de uma dor de barriga sem precedentes (compatível com dizer que está bêbado durante o carnaval), e que só poderá entregar os ovos no final de semana seguinte, altura em que, felizmente, já poderão ser encontrados pela metade do valor. 

Há ainda uma terceira possibilidade, reservada aos mais cara de pau, que consiste em comparecer ao almoço de domingo de mãos abanando e, antes mesmo de atacar o bacalhau, puxar um discurso na linha de "não compactuo com essa prática mercantilista. Me digam, aonde foi parar o verdadeiro simbolismo da Páscoa?!", o que, aliás, não seria completamente infundado. Bom, seja qual for a estratégia adotada, como sugere o provérbio, "odeie o pecado, não o pecador", ou seja, tenha em mente que a Páscoa em si nada tem a ver com o que fizeram dela. 

Não sei se serve de consolo mas, acreditem, poderia ser bem pior: se hoje a especulação nos preços dos ovos de chocolate está na casa dos 650%, imaginem como seria se o Eike Batista estivesse envolvido nisso?
http://g1.globo.com/pop-arte/blog/instante-posterior/post/vale-o-quanto-pesa.html

Nenhum comentário:

Postar um comentário