IVAN MARTINS
25/01/2017 - 08h34 - Atualizado 25/01/2017 13h10
A melhor maneira de ficar sozinho é ficar em casa. No aconchego do lar tem sofá, internet, Netflix, livros, ventilador e geladeira. No meu caso, ainda tem as gatas, que se acomodam ronronando nas minhas pernas. Mas, apesar desses confortos, quem está em casa ainda está sozinho – e vai continuar assim, indefinidamente, se não vestir uma roupinha e colocar os pés na rua.
Não acho – veja bem – que as pessoas têm obrigação de cair na balada. Cada um conhece o seu momento e o seu temperamento. Há horas em que tudo de que a gente precisa é silêncio e isolamento. Mas eu sei, por experiência própria, e por observar os outros à minha volta, que, em outras horas, convívio e companhia são essenciais.
Quando a gente sente que a solidão está nos sufocando, é hora de sair das redes sociais, desligar os aplicativos de relacionamento e experimentar, diretamente, aquilo que faz das grandes cidades o melhor lugar do mundo para viver: a possibilidade de encontros inesperados.
Se a gente entra na pista, em sentido literal ou figurado, tudo pode acontecer.
A densidade humana é tão grande, e a diversidade tão imensa, que é fácil esbarrar numa alma alegre ou rabugenta que combine com a nossa. O que acontecerá a partir disso ninguém sabe. Mas, se você não sair andando pela cidade, e não entrar no restaurante atrás da música – como faz Mia, em La La Land –, pode nunca achar o cara da sua vida.
Tudo bem, acho que exagerei no romantismo.
O sujeito que mudará sua vida não deve aparecer numa roda de samba, enquanto você gira e canta de olhos fechados, embalada pela música. Nem é provável que ele surja mais tarde, quando você, horas depois, ainda estiver pulando feliz diante do DJ, na balada que avança pela madrugada. A chance de encontrar um grande amor em qualquer um desses lugares é remota. Mas, por ínfima que seja, é maior, muito maior, do que no sofá de casa, atualizando o Facebook a cada cinco minutos.
Em casa, a gente sabe com certeza que não vai acontecer nada.
Mesmo que você ache ridícula a ideia de encontrar uma alma gêmea na festa do Santo Forte – ou no aniversário das psicólogas capricornianas de 1990 –, não deveria descartar a possibilidade de um esbarrão erótico. Sabe aquela coisa de olhar, dançar, dar uns beijos e voltar para casa sozinha, sorrindo? Isso acontece na festa, no samba e na balada, assim como nos blocos de Carnaval. Adolescentes acham o máximo. Adultos em geral preferem chegar à Fase 2. Mas, se ela nunca vier, está tudo bem: beijos na boca são gostosos e, definitivamente, nos animam. Enchem de ternura e eletricidade uma noite de chuva.
Sei que, para alguns, esta conversa de sair e dar uns beijos reforça uma ideia frívola sobre relacionamentos humanos. Ela parece reduzir a afetividade a uma troca anônima e banal de fluidos. Mas eu juro que não é isso. O que estou dizendo é que ajustar expectativas pode ajudar a ser feliz.
Sair de casa, ir a uma festa e ver caras novas talvez seja melhor do que ficar em casa pela enésima noite seguida. Dançar até se acabar e dar uns beijos talvez seja mais gostoso do que ficar sozinha. O príncipe encantado não vai passar pela porta da balada com uma lata de energético na mão e um coque samurai no topo da cabeça. Mas o cara de sorriso bonito, aquele olhando para você com ar inseguro, pode ser tudo de que você precisa agora, não para o resto da vida.
Como eu disse, é só um ajuste de expectativa, não uma renúncia às grandes ambições emocionais.
Como eu sou incurável romântico, gosto de pensar que dos encontros casuais também pode sair algo que não seja efêmero. Namoros já começaram com gente se beijando loucamente, perguntando o nome só na hora de ir embora, para trocar telefones. Casamentos podem ser rastreados ao momento em que uma garota foi dançar grudada ao cara que ela achou bonito, aproveitando o rolo compressor da multidão.
Essas coisas não acontecem toda hora, mas, de vez em quando, acontecem. Acredite. Você beija num dia, conversa sem parar no outro e, depois de uma semana, ou de um mês, está perdidamente apaixonada. Quem diz que não é possível? Eu digo que é – e tudo começa com decisão de botar uma roupinha bonita, abrir um sorriso e sair de casa, hoje.
http://epoca.globo.com/sociedade/ivan-martins/noticia/2017/01/na-pista.html
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